Arranjo em estrofes, do capítulo inicial de Iracema, sem acréscimo ou diminuição de uma vírgula, por Soares Feitosa
Verdes mares bravios de minha terra natal,
onde canta a jandaia
nas frondes da carnaúba;
verdes mares, que brilhais
como líquida esmeralda
aos raios do sol nascente,
perlongando as alvas praias
ensombradas de coqueiros.
Serenai, verdes mares e alisai
docemente a vaga impetuosa,
para que o barco do aventureiro
manso resvale à flor das águas.
Onde vai a afoita jangada,
que deixa rápida
a costa cearense, aberta
ao fresco terral a grande vela?
Além,
muito além
daquela serra que ainda azula
no horizonte, nasceu
Iracema.
Iracema,
a virgem
dos lábios de mel, que tinha os cabelos
mais negros
que a asa da graúna
e mais longos
que seu talhe de palmeira.
O favo do jati não era
doce como seu sorriso;
nem a baunilha recendia
no bosque como seu hálito
perfumado.
Mais rápida que a ema
selvagem, a morena virgem
corria o sertão e as matas
do Ipu, onde
campeava sua guerreira tribo,
da grande nação tabajara.
O pé, grácil e nu,
mal roçando,
alisava
apenas a verde pelúcia
que vestia terra com as primeiras águas.
Um dia, ao pino o sol,
ela repousava em um claro
da floresta.
Banhava-lhe
o corpo a sombra da oiticica,
mais fresca do que o orvalho da noite.
Os ramos da acácia silvestre
esparziam flores sobre
os úmidos cabelos.
Escondidos na folhagem
os pássaros
ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho; o aljôfar
d'água ainda a rorejava,
como à doce mangaba que corou
em manhã de chuva.
Enquanto repousa, empluma
das penas do gará as flechas
de seu arco e concerta
com o sabiá
da mata
pousado no galho próximo,
o canto agreste.
A graciosa ará, sua companheira
e amiga, brinca
junto dela.
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